segunda-feira, 26 de abril de 2021

CONTO.

 



A CAVERNA.

Havia qualquer coisa de diferente no rosto de Alice,ela estava assustada, para não dizer transtornada. Madame Lili bem que avisou sobre a caverna e todas as histórias assustadoras que os antigos moradores da aldeia contavam. 

Diziam os antigos, que a caverna da rocha era a porta de entrada para o mundo intraterreno,  habitado por criaturas monstruosas.

Alice ignorou todas as advertências de madame Lili, mesmo sabendo do risco que corria, entrou na caverna assim mesmo, curiosa em descobrir se aquelas histórias eram verdadeiras ou se eram meros contos populares.


Aquela criatura pequena, de nariz pontiagudo, roupas estranhas, esfarrapadas e de orelhas pontudas diante de Alice era a prova definitiva de que a caverna e tudo quanto diziam eram reais, e que uma das tais criaturas de que tanto se falava estava ali, diante de seus assustados olhos. 

A estranha criatura permaneceu imóvel por alguns segundos, depois moveu a cabeça levemente para esquerda e depois para a direita, parecendo estar estudando a reação de Alice, que, diante do inusitado encontro, permaneceu petrificada. Todas as suas palavras sumiram, silêncio absoluto, tamanho era o seu espanto.

O que pareceu-lhe ser um duende, dessas das histórias de contos de fadas, começou a acenar para ela com as mãos, dedos magros, unhas grandes, acenava chamando-a para acompanhá-lo. Alice estava incerta quanto a oferta, deu um passo para trás, pensou em sair correndo o quanto antes da caverna, porém, a sua curiosidade foi ficando cada vez maior do que o seu medo, vencendo-o pouco a pouco. 

O duende acenava com as mãos, era um convite muito estranho, ali tudo era estranho. Por fim, a criatura vendo que Alice permanecia no mesmo lugar, a chamou pelo nome, proferindo sua rouca voz que ecoou no interior da caverna.


- Não tenho medo Alice. Venha comigo menina, não tenha medo, minha criança...


Alice admirou-se da criatura estar falando com ela, aquilo tudo era surreal, o espanto foi dando lugar para admiração e curiosidade. Receosa, no primeiro momento, nada respondeu, ameaçou em dar mais um passo para trás, quando novamente ouviu a voz da pequena criatura.


- Por favor! Não vou lhe machucar... Venha conhecer um mundo cheio de seres fantásticos e mágicos, não é esse o seu desejo?


Vencendo o seu medo, Alice arriscou dialogar com o duende.


- Você é real? Como sabe o meu nome? E meus desejos? É a primeira vez que venho a esta caverna...


- Nós sabemos de todas as coisas que se passam lá em cima, minha pequena, mas, vocês, seres da superfície, nada conhecem de nosso mundo e nem a nosso respeito. Não tenha medo, você foi escolhida, será a primeira a conhecer nossos segredos.


- Não... Não... Isso não é real... Não pode ser... Não mesmo...


- Estou aqui, não estou! Olhe, estou bem na sua frente, veja, sou real, não tenha medo, venha...


Alice deu o primeiro passo em direção ao duende, nos lábios dele despontou um discreto sorriso, sarcástico por sinal, Alice estava admirada demais para perceber os riscos que corria ao acompanhar o misterioso duende. Deu o segundo passo, o terceiro, ainda incerta, lentamente seguiu-o, que continuava acenando. Passo a passo ela foi se distanciando, a pequena criatura sempre a frente, o caminho foi ficando cada vez mais estreito e escuro. Havia medo no olhar de Alice.


- Não enxergo nada, eu vou voltar. Disse ela reclamando.


No mesmo instante, em um estalar de dedos, surgiu nas mãos do duende uma tocha, a sua chama iluminou o rosto da criatura, o mesmo sorriso sarcástico.


- Venha... Temos muito a caminhar, venha. Há luz mais a frente.


Alice seguiu-o embrenhando-se pela caverna.



Era a tarde de uma sexta-feira, começo de verão, dia quente, foi quando a jovem Alice sumiu do povoado do Lajedo. Todos a procuraram por meses, e em todos os locais possíveis, até mesmo em algumas partes da caverna e da floresta em seu entorno, mas, Alice nunca mais foi vista, o seu paradeiro era desconhecido da aldeia. Por fim, depois de meses e meses de procura sem sucesso, sem encontrar uma única pista, desistiram de procurá-la.

Os pais de Alice ficaram arrasados, era a filha caçula dos Andrades.

Passou-se vinte anos desse episódio, a história do desaparecimento de Alice era acrescida às já contadas da caverna e seus fantasmas. Até que certo dia, em uma sexta-feira, começo de verão, moradores relataram ter encontrado uma menina, vagando sozinha pela floresta à procura de seus pais.






domingo, 18 de abril de 2021

Crônica.

 



CHEIRO DE MORTE.


Cheiro de morte. 

Mas quem liga para isso? 

O cheiro de morte está em todos os lugares, em cada canto, em cada cidade, nos bairros, nas pequenas e grandes ruas, nas esquinas e praças. Não podemos esquecer dos parques e lugares turísticos, supermercados, nesses também há cheiro de morte...

Afinal, quem liga para isso?

Cheiro de morte.

No início houve certo incômodo por parte de alguns, transtorno pela possibilidade do corpo sem vida. Não era ainda a morte propriamente dita, no entanto, somente de imaginar tal possibilidade, havia aqueles que ficavam extremamente incomodados com ela, e ficavam desejosos em fazerem qualquer coisa para evitar a tragédia, que, já se insinuava uma tragédia anunciada.

Cheiro de morte.

Acha mesmo que eu estou exagerando?

De fato, a vida perdeu o seu valor, se é que ela teve algum dia. Basta você olhar para o noticiário, ou ler qualquer jornal. Da primeira morte noticiada para já estarmos beirando quatro mil diariamente, e a coisa não vai parar e nem cessar.  Ninguém parece preocupado com o cheiro da morte em cada um. De fato, as pessoas querem o quê eu não sei. Reclamam tanto para nada, distorcem as informações para seu próprio prazer, confundem o cheiro de morte com a fragrância de um perfume qualquer.

Cheiro de morte.

Do quê mesmo estão brincando?

A impressão que tenho é de que alguns estão brincando de roleta russa, mas, a arma nunca está apontada para o próprio nariz, é sim para o nariz dos outros. Infelizmente, no primeiro apertar do gatilho é sempre fatal. Trocam-se as armas, as munições, e a coisa continua rolando sem controle. Não há muito o que fazer. Na verdade, como diz uma amiga, não há mais nada a fazer. 

A locomotiva saiu dos trilhos faz tempo.

Cheiro de morte.

O que estão querendo?

Teorias da conspiração tem aos milhares, falando de um tudo, abrangendo quase todos. Todavia, para quê teorizar se estamos vendo ao vivo e a cores todas as conspirações colocadas em práticas. Querem sim reduzir a população mundial, e pelo visto estão empenhados e eficientes no ato de eliminação. 

Cheiro de mortes.

Quantas covas foram abertas?

É absurdo, porém, verdadeiro. A morte está pulando pela janela. Não há vagas nos cemitérios. Não há coveiros o suficiente para abrir tantos buracos. Faltam caixões, não há mais vagas nos crematórios. Acham que eu sou exagerada? Se não fizerem algo urgentemente, isso será apenas o começo.

Sim, cheiro de mortes.

Onde?

Em todos os lugares. 

Você não percebeu que este odor a cada dia fica cada vez mais forte. É assustadoramente real. Os anos que estamos vivendo ficaram marcados na história da humanidade, se, porventura, sobrar uma humanidade no futuro. Não creio que chegaremos muito longe, bastou um vírus para mostrar que não chegaremos a lugar nenhum. Não pela potência do vírus, não que ele seja um exterminador implacável... Não... Não é isso amigos... O problema sempre estará na nossa incapacidade de cuidarmos de nós mesmos.

O meu problema sou eu, a pandemia simplesmente mostrou que o meu maior inimigo será sempre eu mesma. Quando eu conseguir controlar e dominar o meu eu, então saberei que existe esperança. 

Eu sinto o cheiro de morte.

As minhas lágrimas são as suas também, não se enganem. A sua dor é a minha dor, quando um perde, significa que todos nós perdemos, não existem vencedores nesse macabro jogo.



( L. B )


domingo, 4 de abril de 2021

Crônica.

 



DIAS DE ISOLAMENTO.


   Estou de frente a minha máquina de escrever, uma remington 22, comprada anos atrás, sempre foi o meu desejo, desde a época da escola ter uma dessas belezuras. Claro que, pelo tempo de uso, ela não se encontra em seu melhor estado de conservação, no entanto, com um pouco de cuidado e paciência ao digitar, é possível fazê-la funcional. Geralmente escrevo minhas crônicas diretamente no celular, em um aplicativo de escrita que depois vai para o computador, mas hoje, devido a atual situação em que me encontro, resolvi escrever esse primeiro rascunho de ideia na máquina. 

   Acontece que, pela segunda vez neste ano, estou em quarentena e de afastamento médico do meu trabalho, por doze dias, com suspeita de estar com coronavírus. Eu não imaginava que fosse passar por toda essa angústia outra vez, fazer o quê, aqui estou eu… Isolado, o que me fez lembrar de certo livro...

Me sinto como o jovem tenente, Giovanni Drogo, aprisionando suas esperanças dia após dia no forte Bastiani. Me sinto como ele, uma vez prisioneiro em meu próprio quarto, escrevo essas perecíveis linhas, do alto do meu forte, tendo como companheira a solidão, e livros e mais livros como amigos. Vivo a vã esperança, assim como Drogo, de ter um grandioso acontecimento que me tire da monotonia, a dura realidade, é que nada acontece de novo nesse deserto. ( Belíssimo livro, Deserto dos Tártaros. Escrito por Dino Buzzati Traverso ). 

   Às vezes o meu coração é como o de um marinheiro em alto mar, sendo açoitado pelas turbulências águas, assim como o velho e o mar,  jogado de um lado para o outro, sem ter muito o que fazer. Olho para a janela atrás de mim, o dia já vai indo embora, a noite o alcança com seus longos braços. Eu permaneço aqui, já não sou mais o marinheiro, sou apenas o cronista desavisado, jogando palavras ao vento. Percebam que, nestes últimos dias, o medo escalou as muralhas de muitos corações, adentrou pela porta da frente, sem que o mesmo não percebesse, o coração só foi dar conta do perigo quando era tarde demais. 

   Sou o primeiro da lista.

   De frente a minha máquina de escrever está a Bíblia sagrada, " Bíblia de Jerusalém", presente que ganhei da minha mãe. Do meu lado esquerdo, figura-se em um guardanapo de papel com duas frutas, uma maçã e uma mexerica, que daqui a pouco vou degustar com todo o prazer. Mas, voltando à Bíblia, olhando-a aberta diante de mim, devo sem a menor sombra de dúvidas confiar na vontade soberana de Deus sem ter medo desse vírus. Mesmo porque, o meu medo não é em perecer devido a ele, mas perecer sem ter o meu nome escrito no livro da vida do Cordeiro. Sei que em Deus tenho algo maior e melhor, é que diante dele, todo o joelho dobrará naquele grande dia, assim sendo, termino esta crônica dizendo, ou melhor, reafirmando que, em Deus está toda esperança, nele unicamente. Temos medo, sim, afinal, somos humanos, é normal sentir medo, no entanto, a certeza da vitória é maior do que o medo.

   Deixo aqui registrado os meus sentimentos a todas as famílias do Brasil que não puderam sequer ter dado um funeral digno aos seus que partiram, os meus sinceros sentimentos, e que Deus conforte vossos corações. 


( T. P )

CRÔNICA DE DOMINGO.

      UM PÁSSARO EM MINHA JANELA.     Um pássaro pousou em minha janela.     Quisera eu ter a paz e a tranquilidade da pequena ave que pouso...