domingo, 11 de agosto de 2024

GUERREIRO DA LUZ.




    Os dias são de intenso sofrimento...

    Não sei exatamente como começar a escrever a crônica deste domingo. Não encontro as palavras certas para jogar no papel, nem mesmo sei como me expressar, me fazer compreensível aos meus leitores, se é, que ainda os tenho. Inglória profissão essa de escritor. Convivendo com os fantasmas de seus personagens, nem sempre os tornamos grandes, às vezes, para a maioria de nós, são apenas fantasmas da nossa fantasia, acompanhando-nos a vida inteira. Na verdade, tornei-me neste ser solitário e assustado por tantas quimeras, as do passado como do presente.

      No entanto, certo amigo escritor não era assim...

      Me permitam uma breve explicação, se é que vou conseguir fazê-lo, como eu disse no início, dias de intenso sofrimento. Eu tenho um amigo escritor, embora ele não soubesse que é meu amigo, nunca soube e jamais saberá, já explico toda a tragédia que se entrelaça no curso dessa crônica... Muita calma meus amigos, aos desavisados, essa história não termina com um final feliz. Afinal, eu não estou feliz, talvez muitíssimo abalado pelo que aconteceu ao meu amigo das letras, e para completar, fui demitido, tudo acontecendo recentemente. Esse meu amigo escritor era conhecido, mais de trinta livros publicados, dos quais eu tive o prazer de ler a maioria. É com imensa tristeza que venho lhes informar que este amigo faleceu recentemente, na aurora dos seus quinquagésimo sétimo aniversário. Sim... Ele era novo, cheio de vida, com inúmeros projetos, porém, a fatalidade veio ao seu encontro no projétil de uma bala disparada por ele mesmo, em um terrível atentado contra sua própria vida. Pelo menos é o que disse o boletim policial.

   A sua ausência é dolorosa, a partida inexplicável...

   Quanto a seu nome: Daniel Mastral, era um nome artístico. Perdoe-me por não revelar aqui o seu verdadeiro nome de batismo, ele nunca o fez, vou respeitar sua vontade de não revelá-lo. A sua história pessoal é carregada de dor, luta, sofrimento, vitória, perda, enfim, ele foi um guerreiro até o fim. O seu testemunho de vida é belíssimo, resgatado dos porões obscuros do ocultismo e satanismo, o filho do fogo como era conhecido, para se tornar um filho da luz, no evangelho de Cristo. Teve um primeiro casamento com uma médica, um filho magnífico. Daniel tinha muitos conhecimentos do mundo oculto, segredos que eram estarrecedores, coisas que ninguém nunca imaginou, ele trouxe ao conhecimento do seu público. Episódios que vivenciou quando estava na alta magia. Ele também publicou esses segredos nas entrelinhas de seus romances. As coisas que Daniel falava em suas entrevistas davam arrepios, bem como nos livros, eram pesadas, por diversas vezes revelando estar sob ameaças de morte por revelar segredos da alta cúpula ocultista. 

        A vida lhe deu duros golpes...

       O filho único, adolescente, teve que enfrentar o gigante da depressão, lutou muito junto a família, porém, houve o trágico dia em que não suportando a dor, o jovem de quinze anos tirou a própria vida. Perder o filho foi como se uma espada fosse cravada no coração dos pais. Tempos depois, veio o falecimento da esposa. Essas marcas, ou melhor, feridas que não cicatrizam, quase o derrubou, ele também lutava contra esse monstro da depressão. Daniel casou-se novamente, constituiu nova família, teve outro filho. Enfim, tudo parecia bem... Acontece que, para quem sofre de depressão, tendo perdas tão dolorosas, se não tiver muitíssimo apoio de todos os lados, não se recupera facilmente, às vezes o sorriso não é a representação de alegria, mas, de puro desespero. Daniel, segundo o que consta das autoridades policiais, suicidou-se, entretanto, quem o conhecia de perto não consegue aceitar que ele se matou... Eu também não, quanto a verdade dos fatos, quem saberá? O que se vê e ouve na mídia nem sempre corresponde com a verdade. Teorias se erguendo de todos os lados, quanto a verdade... A verdade ele a levou consigo para o túmulo. 

       Mastral foi um escritor sem igual, com inúmeros títulos que o projetou nacionalmente, livros cujas temáticas giram em torno do que ele vivenciou. Entre os títulos de seus livros estão: "Filho do fogo", ele também escreveu, "A história de Mithry", "Guerreiros da Luz", "As sementes do mal", "Catedral das sombras", "Voz do que clama no deserto". Enfim a lista é longa e não vou me recordar de todos os títulos. A sua partida vai deixar saudades entre aqueles que o amavam, admiradores espalhados pelo Brasil, este que vos escreve é um deles.


domingo, 4 de agosto de 2024

CRÔNICA DE DOMINGO.

 


      

      RABISCOS NO PAPEL.


   O silêncio profundo na manhã de domingo...

   O silêncio profundo... Nada parece se importar, enquanto todos se tornam ausentes, distantes, apenas o frio soprando por debaixo das portas, nas frestas das janelas, em cada canto.  Eu também sou inconstante, e de repente, me vejo sem lugar... Talvez seja o abismo existencial me corroendo por dentro, o tempo todo, todo o tempo.

    O Silêncio profundo continua em seu mergulho no oceano de palavras que nunca foram ditas. O beijo quente que nunca aconteceu, o perfume suave, o toque mágico, quente, ardente, que me enlouquece todas as vezes.  A vida tomou o palco das nossas mentes fantasiosas, mentes insanas, e a fantasia por sua vez, fez da vida um teatro de sombras.

        É domingo.

        Silêncio.

        Nada podemos dizer, entretanto, no palco da imaginação tudo podemos fazer. O café está servido. Derramo um pouco em minha xícara, o vapor da fumaça subindo, tremulando, dançando, rodopiando diante de meus moribundos olhos. Bolachas, pães, pizzas do dia anterior, degustar o café quente, saboroso. Talvez seja esse o destino, mas, afinal, existe mesmo o destino? Seria ele o responsável por criar tudo a seu bel prazer? Às vezes penso que, nós somos os sabotadores do tempo e da vida, tanto das lutas quanto das derrotas acumuladas. Não quero ficar pensando em meus desgraçamentos, na minha vivência maluca e sem sentido. Poeta da solidão que eu me tornei nestes anos. Tendo apenas o sorriso de uma admiradora, os olhinhos ligeiramente puxados debaixo de um gracioso óculos, filha de Júpiter, jovial, sempre atenta com o que escrevo.

      O silêncio profundo na manhã de domingo, os pássaros cantam do lado de fora, a natureza festeja, os homens choram, somos o que desejamos ser, mas, aquilo que desejamos ser não corresponde com o quê de fato deveríamos nos tornar.

    Somos sucessivos aos erros e tentativas, até que haja um ponto certo na imensidão das nossas falhas. Livra-nos ó Deus, livra-nos de nossos eus, de "meus eus", é domingo, finalmente, silêncio momentâneo.

Me sirvo de café pela segunda vez enquanto escrevo essa crônica, à fumaça bailarina sobe rodopiano, o cheiro gostoso do café invade as narinas. Sentado em uma cadeira, estico as pernas para alcançar a outra, 'é minha posição preferida', sigo na incessante busca de qualquer coisa que alegre o coração, e que também diminua a dor da alma.

       É dia de folga,

       Portanto, angústia seguida de descanso e consequentemente, angústia após o descanso, uma vez que, 'minha ansiedade', o meu sofrer 'antecipadamente', me faz triste, menor a cada dia. Não desejo me alongar, o muito falar causa enfado, ainda está silêncio… Ah, que pequeno paraíso terrestre, pena que, daqui a pouco, será maculado com o som de uma cidade que acorda enfurecida.

           Com pressa… 

           Vamos, andem…

           Estou atrasado…

           Buzinas para todos os lados...

           Sai da frente…

           É a cidade despertando, os vizinhos brigando, assim continua o movimento de cada dia. Quisera eu as glórias passadas, os meus dias de infância na fazenda Lindóia, em cima do pé de jambo, o tempo áureo aprisionado na memória… O tempo não volta mais, nunca mais caríssimos, nunca mais....

        Contudo, o meu tempo nunca mais será logo ali na próxima esquina, ou em qualquer outra ,aliás, quem sabe, se dessa vez o destino não me valer, meu silêncio se tornará profundo e eterno, e as minhas palavras serão apenas rabiscos no papel.



sábado, 3 de dezembro de 2022

Crônica de domingo.

 



INSPIRAÇÕES DO CLAUSTRO.


   PARTE  FINAL.


   A primeira impressão que eu tive do seminário foi arrebatadora, todo o conjunto arquitetônico era de uma beleza sem igual, em cada detalhe, cada tijolo,  tudo era magnífico. No seminário de Arujá fiquei em um alojamento pequeno, por nome, cela. Um pequeno quarto, uma cama, banheiro, e um guarda roupas igualmente pequeno, tudo compacto e simples. A casa maior, ou, seminário maior, era um prédio extenso, de quatro andares. Onde também havia salas de aulas e todos os alojamentos.

 No dia seguinte, fomos despertados às seis da manhã, era regra, igualmente no exército, tínhamos que fazer a barba todos os dias, deixar a cama arrumada e lençóis dobrados. Feito isso, íamos para a capela, fazíamos as orações iniciais, logo em seguida era a missa, toda em latim, para somente depois desfrutarmos do café da manhã. Tudo era feito com ordem e decência. Era como se fossemos pequenos soldados.

   Inicialmente, a formação obedecia o seguinte rito. Começava com o candidatado, com duração de três meses. Depois o noviciado; foram dois anos de formação em humanidades, em Arujá ou Curitiba. Concluído esse período, o seminarista teria que viajar para fora do país, provavelmente Espanha, em Salamanca, onde se formaria em Filosofia. Passada essa fase, o seminarista era direcionado para Roma, na Itália, ali teria a fase final, cinco anos de estudos e formação teológica. Basicamente, esse é o cronograma para formação sacerdotal do legionário. 

   Eu não passei da primeira fase, no qual abrangia os três meses iniciais. Embora eu os tenha concluído, não tive autorização para continuar. Os padres me disseram que eu deveria voltar para minha casa e repensar e voltar depois de um ano, caso ainda tivesse certeza da vocação, um ano depois poderia retornar. Na época eu morava com a minha avó, ainda não havia concluído o terceiro colegial. Eu tinha convicção da minha vocação, não compreendia a negativa deles.

   Aceitei, triste é claro, mas não havia o que fazer. Retornei para casa da minha avó, dela, recebi o abraço e o olhar acolhedor de quem sabia que por detrás daquele rostinho cabisbaixo tinha um coração machucado. Os amigos fizeram mil piadas, tive que aguentar tudo. A vida voltou ao seu normal no início daquele ano, escola, trabalho, aos poucos eu fui compreendendo que realmente eu deveria me reavaliar. É claro que foi uma ótima experiência de vida, os ensinamentos que tive, as aulas, as amizades, está tudo no cofre do peito. Agradeço a cada um dos que fizeram parte da minha vida naquele período tão maravilhoso.

   A minha vida seguiu por trilhos bem diferentes depois do seminário. Um ano após ter voltado, eu mudei de religião, o retorno ao seminário jamais aconteceria, mas, os ensinamentos que tive levo-os para a vida toda, ainda nos tempos de hoje lembro-me da oração do pai nosso em latim. A nova religião não me afastou de ninguém, nem me mudou, pelo contrário, continuei com os mesmos amigos nos círculos católicos. A minha mãe é ministra na igreja católica, assídua frequentadora, minha avó também. A vida seguiu o seu curso, tenho apenas que agradecer por tudo. Que o altíssimo abençoe grandemente cada padre, amigos, seminaristas que nunca mais vi. Tenho-os em meu coração, e uma saudade que não cabe no peito. Eu poderia estender essa crônica por muitas outras semanas, contando detalhes das vivências, das descobertas, dos micos e coisas engraçadas que ocorreram, porém, vejo por bem terminar por aqui, quem sabe em outra oportunidade eu volte a falar dessas, aventuras e desventuras desse que vos escreve.

    ( Ut benedicat tibi Deus omnia. )


domingo, 27 de novembro de 2022

CRÔNICA DE DOMINGO.

 



INSPIRAÇÕES DO CLAUSTRO.


   PARTE 2.


   A van estacionou em frente a casa da minha avó, era o fim de tarde do domingo, o relógio escalava as horas enquanto o sol declinava no horizonte, ficando os últimos lampejos. Minha tia foi quem me chamou, dizendo que os padres haviam chegado, eram dois rapazes bonitos e altos, disse ela. Eu terminei de revisar minha mala, estava muito ansioso. Os dois padres desceram as escadas que davam acesso a casa da minha avó, que ficava ao fundo. Eles estavam descontraídos, risonhos e alegres, como da primeira vez em que vieram me visitar. O meu coração batia em descompasso, lá no fundo da minha alma despontava uma fagulha de medo e incerteza, de repente, eu poderia estar me precipitando, porém, tratei de sufocar aquelas ideias insanas no calabouço da mente.

   "Pronto para uma nova jornada em sua vida?Essas foram as primeiras palavras do padre Juan, "Sim, claro", respondi, repetidamente, entre sorrisos tímidos. Na casa da minha avó estavam presentes minha mãe, prima, tia, tio, enfim, uma galera. Depois de alguns minutos de conversas, peguei a mala, me despedi de todos, lágrimas e abraços. Ganhei a rua, para minha surpresa, todos os vizinhos saíram na calçada para um último aceno ao jovem que pretendia dedicar sua vida ao sacerdócio e serviço a Deus. Meio que sem querer, escutei de algumas colegas, que ali figuravam entre os vizinhos, os dizeres do tipo: " tão novo e vai ser padre", e, "nossa, que desperdício". Não dei atenção para aquelas palavras, porém, nunca as esqueci.

   Seguimos viagem rumo a cidade de Arujá, eu estava ansioso para chegar, imaginei que era logo ali, como fui ingênuo, era um trajeto cansativo, tornou-se mais por não conhecê -lo. Lembro-me apenas da rodovia presidente Dutra, o relógio escalou lentamente as horas, aos poucos o nervosismo foi passando, a mente trabalhando enquanto refletia na minha decisão. Em determinado momento, a luz do sol declinou no horizonte, a escuridão estendeu os seus longos braços, as estrelas cintilavam no céu, eu não sabia exatamente onde estávamos. De repente, saímos da rodovia e entramos em uma rua de terra, estreita, caminho tortuoso, com subidas e descidas, ladeado por matas densas de ambos os lados.

   Confesso que fiquei com medo, pensando onde estaria me levando, foi quando então a luz do veículo se deparou com um grande portão de ferro fixado em duas colunas de tijolos vermelhos. A parte de dentro era toda em pedra, semelhante a ruas de algumas cidades históricas, lajotas de pedras em formato hexagonal. O caminho tinha uma leve subida com uma curva acentuada à direita. Um dos padres abriu o portão, entramos, o meu coração voltou a bater descompassado, quando o veículo terminou a subida virando a direita, descortinou-se diante dos meus olhos o seminário Legionários de Cristo. Embora a noite, as luzes, a capela principal, o restaurante, os aposentos dos novatos, recém chegados, como eu, havia outro complexo maior onde ficavam os seminaristas. Fiquei maravilhado com o que se desenhava diante dos meus olhos. Entramos no refeitório, eu e os dois padres fomos servidos com uma pequena refeição servida por outro padre, afinal, não havíamos jantado. O passo seguinte foi me levar até os meus aposentos. Eu finalmente seria um padre, pensei.


   

domingo, 20 de novembro de 2022

CRÔNICA DE DOMINGO.




 INSPIRAÇÕES DO CLAUSTRO.


   PARTE 1.


   O ano não me lembro com exatidão, talvez 1997, possivelmente isso. Na época eu estava no colegial, segundo ano, provavelmente, perdoe-me a terrível falta de memória. Na ocasião eu estudava na escola Honorina Rios de Carvalho Mello, uma boa escola, com professores excelentes, uma diretora linha dura como costumávamos chamar, Fernanda era o nome dela, sempre atenta a todos os detalhes. A escola ficava na cidade de Alumínio, bairro progresso.

    Naquele momento singular da minha vida, na aurora dos meus dezesseis anos, descortinou para este que vos escreve, a religiosidade. Imagino que por influência da minha mãe e avó, sempre de bíblia e terço nas mãos. Nunca fui um adolescente inclinado para bagunças, rebeldias ou qualquer coisa do tipo. Desde os onze anos que passei a morar com o meu avô, minha vida era escola e trabalho, uma educação quase militar do meu avô me direcionou para os movimentos religiosos do catolicismo da época.

     Aos poucos, o desejo eclesiástico foi aflorando dentro da minha alma, como uma semente que nasce e vai crescendo lentamente, assim foi o desejo pelo sacerdócio católico dentro da alma. Era o que eu queria naquele momento, foi tão forte que eu não consegui segurar. Falei com os meus avós, na época eu morava com eles, contei-lhes das minhas intenções religiosas. No primeiro momento ficaram sem entender, duvidando eu acho, adolescente ainda, parecia muito precoce para ter tais inclinações. É claro que havia outros desejos trancados na caixa do peito " mais tarde falarei deles". Comunicado a todos, comecei a procurar por um seminário. Redentoristas, Carmelitas descalços, seminário diocesano de Osasco, por fim, meio que ao acaso, encontrei um que me agradou demais. Legionários de Cristo na cidade de Arujá, um belíssimo seminário com uma estrutura excepcional.

  Feito os primeiros contatos, as conversas iniciais, agendei com os padres uma visita em minha casa, que foi muito agradável e produtiva, na época eu morava com os meus avós, na cidade de Alumínio, vila Brasilina. Como dito anteriormente, eu deveria ter meus dezesseis, se não me falha a memória, estava no colegial, trabalhava meio período no supermercado do meu tio, a expectativa de um mundo novo tomou conta de mim. Semanas depois, veio uma carta dos padres aceitando minha admissão no seminário, mandaram a lista do que eu precisava, roupas, camisas, calças sociais, enfim, tudo deveria de ser identificado com as iniciais do meu nome. O dia de ir embora para a nova vida, 'religiosa', se aproximava, eu já respirava ares de um seminarista, os meus familiares começaram a levar a sério a minha decisão, a minha avó, católica assídua, integrante da legião de Maria, era uma felicidade só. Os meus pais, na ocasião, residiam Minas Gerais, devido a essa minha decisão, resolveram mudar para São Paulo, chegariam antes da minha partida.

     A minha família, na grande maioria católica, teriam um membro padre, eram as rezas de minha vovó e mãe sendo atendidas, diziam alguns primos. Mamãe havia chegado de Minas, não se cabendo de alegria, abraços e beijos no seu "futuro padre". Comecei a organizar as camisas brancas, calças sociais pretas, cuecas, meias, toalhas, tudo pronto e identificado, mala feita. Era o final de ano, figuravam os primeiros dias de férias. Uma vez no seminário, dando tudo certo, eu faria o terceiro colegial na escola do próprio seminário. O dia chegou, os dois padres que vieram me visitar anteriormente, retornaram, estavam prontos para levar o adolescente desejoso em retornar como padre, vieram em uma Van. Despedidas, abraços, lágrimas. A face iluminada da minha avó e mãe, de uma alegria e orgulho que não cabiam nelas. Um último aceno, o adeus de um adolescente determinado a retornar como sacerdote. 


   

domingo, 13 de novembro de 2022

CRÔNICA DE DOMINGO.

 


    GILMAR E CARLOS.


   — Olá! Gilmar! Quem diria... Você por aqui! Quem é vivo sempre aparece, tudo bem com você?

   — Ô! Carlos! Quanto tempo meu camarada! Foi você quem sumiu homem... não te vejo faz tempo.

   — Estou sempre por aí, perambulando, aqui, ali, e você? Está fazendo o que dá vida?

   — Depois que eu saí da empresa fiquei um ano parado, voltei a trabalhar não faz muito tempo, arrumei emprego em um supermercado faz dois anos, estou novamente exercendo a minha antiga profissão, açougueiro. E você... o que faz da vida? Aposentou ou ainda tá na ativa?

   — Quem me dera aposentar, faltam uns três anos eu acho, estou na mesma empresa, mesmo setor, função não mudou, o pessoal é outro agora, da velha guarda ficou eu e o Gerson.

   — É... O tempo voa caríssimo. Eu estou com o processo correndo contra a empresa, lembra? Já faz cinco anos nessa labuta interminável.

   — Caramba! Tudo isso? E a coluna? Me lembro que você operou, colocou parafuso, ou qualquer coisa assim... ainda dói muito?

   — Desde que eu fiz a cirurgia nunca parou de doer, essa é a verdade, às vezes menos, outras mais, a gente aprende a conviver com a dor. Quanto ao processo... você sabe, a justiça Brasileira nunca foi das mais rápidas, daí veio a pandemia, atrasou ainda mais o andamento, agora, política, sei não viu...

   — Nem me fale desse vírus maldito, peguei duas vezes esse raio, quanto ao processo, fica em paz, vai dar tudo certo, em breve você retorna na empresa.

   — Tomará amigo, tomará, embora eu não tenha lá muitas esperanças. Rapaz, você falando aí do vírus, e eu que peguei três vezes essa merda, depois de tomar quatro doses da vacina, não me adiantou foi é nada ter tomado tanta vacina, fiquei é todo ferrado.

   — É um exagero tanta vacina, tudo enganação, quantas pessoas não morreram depois que tomaram. A minha tia tomou as duas doses, não saía de casa para nada, pegou novamente e acabou falecendo, mas, parece que todo mundo esqueceu do vírus né, agora o único assunto é direita, esquerda, isso pode, aquilo não...

   — Bem isso amigo, no caso da vacina eu só tomei mesmo porque fui obrigado por causa do trabalho, eu também perdi um tio, o Carlinhos, que trabalhava na Grostal, lembra dele?

   — Sim, lembro, o homem era um touro, fazer o quê... É o sistema querendo equilibrar a balança do mundo.

   — E bem que avisaram por essa internet da vida, mas, ninguém acredita, acham que se fala demais, que é besteira, isso, aquilo outro, olha só, e não é que muitos tinham razão. 

   — O pessoal prefere dar ouvidos ao... você sabe quem, igual as pesquisas, onde já se viu, o cara estar com quarenta e tantos por cento das intenções de votos e não consegue juntar meia dúzia de desajustados... Já o da situação, até lá fora faz motociata de última hora e junta multidão, como então ele pôde estar atrás nas pesquisas, e mais, perder em dois turnos? Como é isso?

   — A mentira falada por meia dúzia está soando mais alto do que toda a direita junta, essa é a verdade. Ou, como diz certo cidadão da esquerda, a mentira voa, enquanto a verdade rasteja.

   — O problema é que a direita não reagiu quando teve tempo, se acomodou, aceitou tudo, não repassou nada, ficou apenas olhando o bonde passar, e passou, com tudo, atropelando geral.

   — A coisa está a passos de tartaruga, Brasil, tudo é muito complicado nesse lugar, impressionante, fazer o que, o jeito é empurrar com a barriga.

   — Se não fizerem nada vai acontecer igual lá fora, olha o exemplo do americano.

   — É o que sempre disse amigo, eu cansei de falar, mas, ninguém escutou mesmo... Olha rapaz, o papo está bom demais, foi um prazer te reencontrar, mas, estou atrasado, tenho que trabalhar daqui a pouco, até mais ver meu camarada, aparece por aqui outras vezes.

   — Vai lá amigo, bom trabalho para você, eu também estou atrasado, não sei nem como a mulher não me ligou ainda, se já não tive por aí com vassoura na mão atrás de mim. Até mais, apareço sim.

domingo, 6 de novembro de 2022

CRÔNICA DE DOMINGO.

 


O JOGO SÓ ACABA COM O APITO FINAL.


    Vivemos uma revolução? 

    Pessoas ganham as ruas junto aos caminhoneiros, protestos e caras pintadas, gritos, palavras de ordem ardendo em dissonantes e frenéticos gritos. Do outro lado, andam dizendo que aqueles que figuram nas beiras das rodovias são desordeiros, fascistas e bagunceiros, dentre outras designações negativas, não me parece que são o que está se falando. É de fato um movimento popular brasileiro, nascido de uma indignação perante atitudes cometidas pelos mandatários do pensamento da jurisprudência. O resultado entre um e outro na disputa pela cadeira maior, foi no mínimo descompensada unicamente para um lado, enquanto o outro foi duramente reprimido, atacado e desacreditado.

    Os dias se escalam cada vez mais tensos, a sensação de que estamos à beira de um grande abismo prestes a cair é cada vez maior, caminhando sem ter como se distanciar desse enorme precipício. A confusão e o caos social se alastra como fogo em folhas secas, a cada hora notícias aterrorizantes tomam as nossas mídias de assalto deixando o coração em descompasso. Começou pequeno, no domingo, logo após o resultado das urnas. Tão prontamente os caminhoneiros se organizaram e iniciou-se a paralisação nas rodovias pelo país, aqui, alí e acolá. Já no decurso da segunda-feira, quando a ala vencedora ainda comemorava, o que pareceu um pequeno movimento começou a agigantar-se, e ainda ganha corpo pelo Brasil.

    Os movimentos e protestos estão fermentando a massa popular cada vez com mais força, multidões de verde e amarelo, com bandeiras e caras pintadas figuram na frente de quartéis militares em coro. A ala direita do movimento contesta os resultados, dizendo que não foram justos, que, de alguma forma, houve erros e manipulações nas urnas por meio de algoritmos específicos. A esquerda se defende dizendo que foi uma escolha legítima e democrática, enfatizando a segurança no processo eletrônico, ressaltando a necessidade do presidente reconhecer a derrota. Concernente aos protestos e pedidos de intervenção, não me parece que este se fará como deseja o povo. Não sou especialista no assunto relativo a leis e constituição, não sei bem o que dizer.

    Analisando o cenário cuidadosamente, nesta já, sexta-feira, embora pareça cada vez mais distante da realidade o que o povo tanto clama nas ruas, no entanto, olhando por outro ângulo, tenho esperanças para que algo grandioso aconteça, e isso é renovador. Sei que muitos estão desacreditados que pedir para acionar esse ou aquele artigo com essa ou aquela finalidade vá resolver. Independente do quê, e como peçam, sabemos que a vitória não se dará da maneira fácil. Por favor, não sejamos pessimistas, não vamos jogar agora fria em ninguém. Eu sei com o pouquíssimo que conheço da constituição de 88, não haver espaço nela para acionar certos artigos citados, assim, ao vento, no entanto, caso apareça, repentinamente, provas irrefutáveis de uma fraude, acredito que isso possa mudar tudo. O melhor a ser feito é se posicionar ( espero que você tenha entendido ) e esperar, uma vez que as esferas superiores do poder estão em um mesmo entendimento de reconhecimento do resultado das eleições, não abrindo espaço para contestações, provocá-los de maneira inteligente dentro das quatro linhas é cabível. 

    Caros amigos e amigas, o tempo de se ter feito alguma coisa não passou, ainda é possível agir, algo pode ser feito... Estamos na última hora, sei o quanto é perigoso. 

     Pergunto novamente: A esquerda ganhou? 

     Às vezes, depois dos quarenta e cinco do primeiro tempo de um jogo, com um placar extremamente desfavorável pôde ser obtida vitória, maluquice, sim, concordo, porém, perfeitamente possível.

      O jogo só acaba com o apito final.

MOSAICO DE SENTIMENTOS NUS.

      As janelas do castelo estavam abertas, escancaradas ao público de modo que era possível ver dentro do próprio reino.      Nos recôndit...